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A PRÁTICA DA CAPOEIRA E O DESENVOLVIMENTO DE UMA CULTURA DE PAZ ATRAVÉS DO CONTROLE DOS IMPULSOS

Fala Mestre | postado em 23/01/2017

Samuel Gustavo Ferreira

Graduado em Licenciatura Plena pela ESEFJ - Escola Superior de Educação Física de Jundiaí.

Pós-graduado em Neurociência Aplicada à Educação – Anhembi Morumbi.

Palestrante nos eventos:

3º Congresso Brasileiro de Capoeira Escolar – CEPEUSP 11/2015.

4º evento de Clínica de Capoeira – CEPEUSP 11/2016.

12º e 13º Encontro Científico e de Iniciação Científica da Universidade Anhembi Morumbi – 11/2015 e 11/2016.  

RESUMO

Se o controle dos impulsos contribui para pacificar atos e condutas destrutivas na humanidade, geralmente, contidos na emoção da raiva. Podemos usar a capoeira no aprendizado dessa habilidade emocional e, com isso, conter impulsos que nos transcende a momentos de fúria e agressividade. Sendo assim, podemos contribuir para a construção de uma cultura de paz na educação.

Esse trabalho discute como a capoeira pode mediar uma pedagogia voltada à cultura de paz através do controle dos impulsos.

Palavras-Chave: Neurociência; Capoeira; Educação; Inconsciente.

INTRODUÇÃO

Estimular os educadores à pesquisa científica no contexto aqui apresentado sempre trará descobertas que se reverterão em matéria-prima a favor da humanidade. Sendo as pessoas afetadas pelas circunstâncias, devemos, contudo, criar oportunidades, tanto para educadores, quanto para nossas crianças, para que ambos possam conscientizar-se de que o convívio pacífico da vida humana - a paz - é comumente aprendido. Pois, é necessário termos em mãos a direção do futuro humano sem que para isso precisássemos julgar a teoria independentemente da prática. Russel (2014, pág.54) diz que “o estímulo à pesquisa é mais uma questão que cai diretamente dentro do Estado, porque os benefícios das descobertas se revertem em favor da comunidade”. Porém, independente de qualquer apoio governamental, trago a mente humano para dentro do âmbito escolar para que se façamos bom uso da mesma e que de certa forma venha colaborar em benefício da sociedade.

Este artigo não pretende ser nada especulativo e sim ater-se a fundamentos sólidos que unam o estudo do comportamento a ciência da mente. E mesmo sabendo que os fenômenos da mente humana não são tão bem mapeados, pretende-se, assim mesmo, penetrar neste obscuro e misterioso dualismo que assombra o encantador mundo psíquico e que, ao mesmo tempo, pode nos trazer luz em meio a essa escuridão.

Não se busca julgar o que é bom ou ruim, nem se tem por objetivo, o mesmo de grandes moralistas: criar uma forma (mentalidade) definitiva. Ainda que consigamos elaborar um conjunto de regras que originassem apenas conclusões sensatas, Pinker (1998, pág. 24) afirma que “não é nada fácil usar todas elas para guiar inteligentemente o comportamento”. Porém, temos a convicção de que para um melhor convívio em sociedade devemos no mínimo ser coniventes com a paz, que não deve se separar da consciência humana e nem tampouco dos currículos nacionais. Não devemos nos cegar diante tamanha importância e nem nos entorpecer desse pequeno nuance diante um mundo tomado por ganância, caos, medo e raiva. Quando os homens aprenderem a subordinar seu próprio bem ao bem de um todo maior, afirma Russel (2014, pág.44) que “não haverá nenhuma razão válida para se deter a raça humana”.

Não se pode dizer que esse trabalho seja inovador, mas pretende desbravar, sem misoneísmo, um novo caminho que modele o futuro da humanidade, de forma a conduzir nossas crianças a um comportamento emocional mais justo e bondoso, construindo de maneira hábil o bloco de construção das mesmas, introjetando efetivamente na sua personalidade, caráter e self autobiográfico, atingindo âmago de seu EU mais profundo.

Segundo Norman (2011), “os instintos resistem às mudanças e, acredita-se, tem um propósito claro, irredutível e fisicamente estruturado, como a sobrevivência”. Porém, veremos neste trabalho que a impulsividade está entrelaçada aos aspectos sociais da conduta humana, ou seja, como nos dirigimos aos fatos e aos outros. Portanto, se direcionadas intencionalmente, atos e condutas virtuosas, podem moldar nossas crianças ao interesse de um bem comum a todos, sem que para isso seja necessários milhões de anos.

Parte do comportamento humano que supomos naturais e espontâneos, segundo Pinker (1998), é um dificílimo problema de engenharia. Pois, sabe-se que a estrutura que regula os comportamentos instintivos é o hipocampo, e que ele é plástico, assim como a amígdala, a estrutura que processa a emoção e a ansiedade. E a principal área responsável pela inibição de nossas emoções e instintos, é a região pré-frontal, sendo a chave para conter nossas ações destrutivas e, contudo, ordenar nosso comportamento emocional. Assim, podemos tomar decisões mais coerentes, planejar com mais cautela nossas ações e adotar estratégias comportamentais mais adequadas à situação física e social. Segundo Norman (2011, pág. 300), “grande parte do nosso cérebro é inibitório, e impulsos e instintos indesejados surgem com força total”, porém, quando perdemos essa inibição, diz o autor que eles nos envergonham e acabam com nossos relacionamentos e nossas famílias.

A grande incógnita dessa questão sobre os instintos é o desprestígio em não acreditarmos na nossa capacidade de receber um estímulo, processar e exercer uma resposta que nos transcenda a um estado metacognitivo, que, consequentemente possam nos impedir de agir com esses instintos brutais indesejados e assumir o controle de nossas emoções. Esses instintos, podem até ser compreendidos como uma atividade de “sublimação”, que até agora, é um processo misterioso pelo qual os instintos animais brutos são “civilizados”, mas, para Norman (2011), a sublimação sempre foi um enigma. Para o autor, grande parte da criação dos filhos envolve “civilizar” as crianças, ensinando-as a reprimir ou a canalizar seus instintos em expressões aceitáveis, como nos esportes de contato. 

Como podemos observar, esse trabalho propõe um profundo mergulho sobre essa esfera sem fim que é a mente humana e, por intermédio de conteúdos adjacentes às neurociências, buscaremos caminhar pela tão almejada busca da felicidade, pois, é na escuridão de hoje que podemos desenvolver a paz e o amor nesse mundo devastado por gigantescas tormentas de raiva, soberba e tristeza que nos conduzem a essa situação tão angustiante de medo e guerra. “Semear aquilo que realmente é importante para a construção de um homem melhor, de uma sociedade melhor. Com certeza, além de proporcionar a paz, esses valores nos ajudarão a ser mais felizes” (Von, 2003 pág. 21). No entanto, a compreensão dos mecanismos neurobiológicos fundamentais relacionados às emoções, segundo Damásio (2012) poderá ser capaz de aproximar o homem da compreensão de sua própria condição humana.

Este trabalho se estrutura através de pesquisas feitas nas teorias da nova ciência da mente, nos teóricos do inconsciente, na filosofia de Bertrand Russel “baseada na crença de que o impulso tem mais efeito do que o propósito consciente na modelagem da vida dos homens” (Russsel, 2014, pág. 1) e no programa “A Arte de Viver em Paz”, criado pela Universidade Holística Internacional de Brasília (Unipaz) publicado pela UNESCO e que serve de guia para que governos, organizações internacionais e sociedade civil possam planejar sua atividade e tomar providências para promover e fortalecer uma cultura de paz no novo milênio (Von, 2003 pág. 11).

 

2. OBJETIVO

O presente trabalho tem como objetivo relacionar a prática da capoeira ao controle dos impulsos, podendo, assim, contribuir para a construção de uma pedagogia de paz na educação, a partir da prática dessa arte.

Pretende-se, portanto, desvelar os aspectos envolvidos na consciência aos impulsos que nos governam, a fim de, transmitir aspectos inovadores para os currículos educacionais, no intuito de contribuir para uma proposta pedagógica direcionada a cultura de paz. Buscando, desta forma, discutir como a linguagem emocional, se direcionada intencionalmente, pode tornar-se uma habilidade emocional implícita ao processo de desenvolvimento das crianças.

3. METODOLOGIA

A metodologia do presente trabalho consiste na revisão bibliográfica a partir de livros e artigos referentes ao tema proposto, buscando a partir de uma visão ampla sobre o tema, com espírito crítico e inovador.

4. DESENVOLVIMENTO

O ser humano é facilmente governado por suas emoções tendo em vista consequências muitas vezes desastrosas para o convívio pacífico da humanidade. Principalmente, quando se trata dos impulsos, que podem nos dirigir tanto a vida quanto a morte. E como, expressão da vida, nós desejamos que os impulsos despertem-se para a vida e não a morte.

Quando falamos de comportamento e ação, é do cérebro que estamos falando, pois ele é o responsável por todas as façanhas que nos dirigem as coisas, pensamentos e aos outros. Segundo Kandel (2011, pág. 10), “o cérebro é um órgão biológico complexo, de grande capacidade computacional que constrói nossas experiências sensoriais, regula nossos pensamentos e emoções e controla nossas ações”. E desbravar essas questões filosóficas muito amplas do comportamento humano e do cérebro que o controla, com as quais muitos pensadores se debateram durante milênios, não é uma tarefa simples, mas, a neurociência, ou chamada “nova ciência da mente” vem dispondo de muitas informações para enfrentarmos essas questões com uma nova visão, com novos conceitos e com muito mais esperança de que podemos transformar o mundo num mundo melhor, através de nossa introspecção.

Se considerarmos, por exemplo, que após todas as etapas da organização ascendente do cérebro, filogênicas e ontogênicas, até o “ápice” de nossa transformação como sujeito cognitivo, fica claro que o ser humano desenvolveu instintos baixos, tanto nas emoções básicas ou primárias, como, por exemplo: a raiva, quanto nas emoções secundárias ou sociais, tal como: ódio, descompaixão etc. Se quisermos colher a paz, devemos semear uma cultura baseada em valores que prezem o bem comum (Von, 2003 pág. 21).

Em pleno século XXI, ainda agimos com esses instintos, que na maioria das vezes, são inconscientes. Mas, ao mesmo tempo em que sabemos sobre o fato de agirmos inconscientemente, as novas ciências da mente afirmam que o inconsciente influencia nosso pensamento e ação consciente. Portanto, esses sentimentos, cujo parâmetro é negativo, vindos de cima para baixo (aferente), ou seja, do córtex pré-frontal - que mantém relação direta com os processos e as respostas automática (Consenza, 1990; Guyton, 2004; Machado, 2004; Meneses, 2004) e, também, considerada a sede da personalidade (Devi e cols. 2004; Lent, 2005) – podem nos direcionar a ações que, se forem promovidos pelos instintos baixos, não serão pertinentes ao convívio pacífico da humanidade. Portanto, devemos reavaliá-los, afinal, somos o único animal capaz de usar suas funções cognitivas e aplicá-las para o que pode ser considerado bem tanto quanto para o mal. Pois, “a maioria dos animais não tem o sistema nervoso complexo o suficiente para permitir que esses alarmes se tornem verdadeiros” (Hanson, 2012, pág. 26).

Falar em controle inconsciente não é oximoro, pois, como foi dito anteriormente, novas concepções vêm revolucionando e desvendando esses mecanismos. Assim como ocorreu no desenvolvimento humano, a ciência também foi ao longo do tempo revolucionando e aprimorando com novas descobertas e conceitos plausíveis para o entendimento do cérebro humano, que inicialmente era considerado uma caixa-preta.

A partir do século II, o médico grego Galeno, propôs que os nervos conduziriam um fluido secretado pelo encéfalo e pela medula espinhal para os tecidos na periferia. Mas, somente no século XIX, o italiano Camilo Golgi e o espanhol Santiago Ramón y Cajal produziram descrições detalhadas e exatas das células nervosas, trazendo as evidências iniciais para a doutrina neuronal – o princípio de que os neurônios individuais são os blocos construtivos elementares e os elementos sinalizadores do sistema nervoso. Em 1920, Ross Harison, mostrou que os dendritos e os axônios crescem a partir do corpo celular. Em meados da década de 1950, Sanford Palay demonstrou a existência das sinapses - marco definitivo da doutrina neuronal. (Kandel, 2014)

As tentativas de integrar conceitos biológicos e psicológicos no estudo do comportamento iniciaram por volta de 1800 - período marcado pelo localizacionismo cerebral através de Franz Joseph Gall, que defendia que o encéfalo é o órgão da mente e que todas as funções mentais emanam dele e argumentava que determinadas regiões do córtex cerebral controlavam funções específicas. Com bases em seus achados, Gall desenhou mapas corticais das funções encefálicas localizadas concluindo como uma disciplina, denominada fenomenologia, uma disciplina preocupada com a determinação da personalidade e do caráter com base na forma detalhada do crânio. (Kandel, 2014)

A discussão sobre motivações inconscientes, segundo Callegaro (2011) tem pelo menos 2 mil anos na literatura e na filosofia. Porém, com toda a evolução tecnológica, é possível, hoje em dia, em tempos reais, estudar os efeitos do inconsciente no comportamento. É possível também ilustrar os processos automáticos da mente e do comportamento. Sendo assim, foram realizadas inúmeras pesquisas com síndromes e condições neuropsicológicas que comprovaram a influencia do inconsciente sobre a tomada de decisão. Pois, a influência exercida por ele – o inconsciente – é tamanha que Freud utilizava a Metáfora do Iceberg para relatar a superioridade do processamento inconsciente sobre a consciência.

O sistema límbico (SL) ficou definido como o circuito neuronal relacionado às respostas emocionais e aos impulsos motivacionais. A descrição inicial do grand lobe limbique deve-se ao neurologista francês Pierre Paul Broca, em 1878, que considerava essencial seu papel no comportamento emocional (Meneses e col. 2011).

Contudo, sabe-se que, de fato, as emoções como vimos até o dado momento, são desencadeadas por respostas fisiológicas e por processos automáticos, geralmente inconscientes. Callegaro (2011, pág. 25) afirma que “a maior parte do processamento realizado pelo cérebro humano é inconsciente, e só temos acesso consciente a um resumo editado e nada fidedigno dessas informações”, portanto, devemos fortalecer a ideia de que podemos torná-las consciente através de circuitos emocionais competentes, pois, segundo Damásio (2004) “podemos tomar consciência das emoções que são processadas inconscientemente, pois elas são representadas em nossa mente consciente por meio dos sentidos”. Callegaro (2011, pág. 32) ainda coloca que “toda a nossa percepção consciente é baseada em um processamento sensorial que opera inconscientemente”.

Benett e Harcker, (2003, pág. 17) afirmam que:

um ser humano é uma unidade psicofísica, um animal que consegue percepcionar, agir intencionalmente, raciocinar e sentir emoções, um animal utilizador de linguagem que não é só meramente consciente, mas também autoconsciente.

 

Sendo assim, devemos controlar os impulsos antes que se decida uma resposta inconsciente indesejada referente aos instintos baixos. Julgo que é possível dizer, com alguma confiança, que esse estado metacognitivo reside no que Kornhuber afirmava ser o “potencial de prontidão”. O mesmo que o Dr. Benjamin Libet (Apud Mascaro, 2008) demonstrou num artigo, preceder a tomada consciente de decisão para uma ação, e que Mascaro (2008) afirma ser comandado pelo sistema DC (corrente continua).

Temos muito que aprender sobre como o cérebro humano processa os julgamentos de comportamento e controla as ações (Damásio 2011, pág. 346). Mas, como diria Nietzsche (2010, pág.34): “não conhecemos outro método para bem agir do que sempre bem pensar; o pensamento é ação e a ação supõe pensamento”. Portanto, “precisamos disciplinar nossos pensamentos, nossas palavras e nossas ações”. (Von 2003 pág. 21)

Controlar as próprias condutas e emoções não é uma atividade fácil, normalmente não temos acesso consciente às causas reais de nossas ações. Sendo assim, muito dos nossos erros, ou ações indesejadas, ocorrem quando esses mecanismos inconscientes de nossos instintos não são tão bem controlados. E controlá-los requer muito treino para que nossos neurônios formem circuitos duradouros, fortalecendo conexões entre si como resultado da atividade mental permanente.

Russel (1872-1970, pág. 16) afirma que:

Existem nos homens certos impulsos e desejos – os que levam às drogas, por exemplo – que não crescem a partir do princípio central; tais impulsos, quando se tornam fortes o bastante para serem prejudiciais, têm de ser reprimidos pela autodisciplina.

Somos capazes de pensar de modo crível sobre a possibilidade em controlarmos as influentes implicações do inconsciente sobre nosso comportamento e nos permitirmos nos autoexaminar através de estratégias conscientes para restringir sua influência, tornando conscientes os resultados das emoções processadas inconscientemente. Tornarmos hábeis com a mente e, portanto, com o cérebro, e assim, Hanson (2012) refere que aumenta a probabilidade de nosso mundo se direcionar para o melhor caminho. O mecanismo não consciente tem que ser treinado pela mente consciente para desferir um bom contragolpe emocional (Damásio, 2011, pág. 344).

Callegaro, (2011, pág. 91) afirma que:

 

Conforme o modelo do novo inconsciente, sistemas psicológicos especializados evoluíram de modo a exercer, silenciosamente, domínio sobre nossa percepção, sobre nossa memória, sobre nossa emoção e sobre nosso comportamento, tecendo uma narrativa autobiográfica entremeada de auto-engano e acobertando dos outros e de nós mesmos nossos interesses socialmente condenáveis.

Sabe-se que “a impulsividade consiste na dificuldade no processo de inibição necessário para esperar (aguardar a vez na fila, terminar de escutar a pergunta para responder, aumentar o tempo da resposta, deixar escapar comentários inapropriados, etc.), impedindo o surgimento de opções adequadas para a situação” (Camañes, 2008, p.26). Portanto, pessoas que não controlam seus impulsos acabam marginalizadas pelas demais. No caso escolar, marginalizada pelos próprios professores, que acabam rotulando essas crianças como bagunceiras, desatentas, malcriadas, as autodiagnosticam com TDA ou TDAH, pois, devido o anseio de cumprir com suas obrigações conteúdista, vão logo piorando a situação mandando-as pensar, ou então para a diretoria. No que pensar, é que elas não sabem, pois mal sabem o que fizeram por merecer. E, tampouco foram orientadas sobre seus impulsos.

A raiva, por exemplo, se manifesta basicamente por comportamentos agressivos, e mesmo tendo uma grande dificuldade em se identificar a partir de onde são geradas as emoções, em meados de 1920, observou-se que o hipotálamo estaria envolvido com a expressão da raiva e agressividade, ao passo que o telencéfalo mediaria efeitos inibitório sobre esse comportamento (Bear e cols., 2002). Portanto, trabalhando emoções como a raiva, no plano individual, estaremos fortalecendo essas áreas cerebrais.

O fato de reconhecermos a emoção da raiva e nomeá-la com a linguagem emocional denominada, controle dos impulsos, não garante um efeito inibitório instantâneo. Porém, dirigir-se às coisas e/ou aos outros, inibindo antecipadamente a consciência sobre nossas ações inadequadas, como por exemplo, a raiva, contribuirá para a aprendizagem de hábitos emocionais de grande valia no que diz respeito à moral, ética e cidadania plena. Tal consciência exerce, portanto, uma força equivalente, mas em sentido contrário da raiva – que está relacionada à atividade cerebral no septo – e na agressividade – que está intimamente ligada ao giro do cíngulo, alimentando conscientemente a força da aversão a mesma.

Nesse ponto de vista, a aprendizagem das habilidades emocionais na prática da capoeira tem certa semelhança à fenomenologia. Se, grosso modo, a fenomenologia é compreendida em como nos relacionamos com os objetos e como eles influenciam no que nós somos, ou seja, como nos dirigimos às coisas mesmas, logo pode-se pensar que a aprendizagem das habilidades emocionais aplicada à prática da capoeira se define em como nós nos portamos a uma determinada experiência emocional, ou seja, como nos dirigimos a ela mesma e como ela influenciará nosso self.

Como apresentado até então, somos controlados durante uma ação, na maioria das vezes, por processos inconscientes, que são importantes, pois trouxeram vantagens, inclusive para nossa evolução. Tal controle não consciente ocorre com uma frequência considerável, nos mais variados contextos, e conforme ressalta Damásio (2011), merecem atenção, pois, também estão em boa medida, e de vários modos, sobre o governo consciente.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na capoeira, os golpes traumatizantes, devem ser controlados pelos capoeiristas para que não agridam de forma violenta seus adversários que muitas vezes são seus melhores amigos. A luta da capoeira, como num teatro, dois lutadores simulam uma briga, pois sem esse conceito, o jogo vira luta propriamente dita.

Na capoeira pedagógica o educador deve enfatizar sempre a importância de não agredir o amigo, controlar os impulsos e ensiná-los a ter autocontrole. Por exemplo, no golpe do martelo, que, antes de atingir o rosto do amigo, o capoeirista controla a velocidade e distância para não acertá-lo. Dessa forma ele poderá controlar o movimento, mas isso pode e deve ser correlacionado ao controle da emoção, efetivamente, a raiva, por exemplo. Portanto, devem ser feitas analogias a situações semelhantes, dentro do contexto social a qual vivemos, pois, o que falta para a maioria dos educadores é o direcionamento intencional para que as crianças aprendam a controlar seus impulsos para cumprimento das regras que julgamos serem mais adequadas para uma sociedade mais humanizada.

Com tal direcionamento podemos mudar nosso comportamento e reprogramar nosso cérebro, o que depende muito de como suas estruturas relacionam entre si e das organizações dos neurônios em circuitos anatômicos para obterem funções precisas. Sendo assim, podemos determinar conexões neuronais coerentes a uma sociedade mais plena, sem ódio, raiva, agressividade entre outros males que permeiam nosso mundo, trazendo guerras e desentendimentos desnecessários.

Nossos comportamentos podem ser modificados, mas, se tratando da infância, onde as experiências são marcas determinantes no comportamento, na personalidade e no caráter do indivíduo, podemos modular os processos mentais dando um sentido de SER – autoconsciente – dando a cada indivíduo um sentido próprio da autopercepção, inserindo informações, associações, insights, habilidades e hábitos que correspondam ao interesse de um todo maior.

6. REFERÊNCIAS

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CALLEGARO, Marco Montarroyos – O novo inconsciente: como a terapia cognitiva e as neurociências revolucionaram o modelo do processamento mental / Marco Montarroyos Callegaro. – Porto Alegre: Artmed, 2011.

CAMAÑES Bonet, Trinidad: Aprendendo com crianças hiperativas: Um desafio educativo/ Trinidad Bonet Camãnes, Yolanda Soriano García, Cristina Solano Méndez; Revisão técnica Irani Tomiatto de Oliveira, Tradução Guilherme Matias Grumício – São Paulo: Aingage Learming, 2008.

CONSENZA RM - Fundamentos de neuroanatomia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1990.

DAMÁSIO, Antônio R. – E o cérebro criou o Homem / Antônio R. Damásio; tradução Laura Teixeira Motta – São Paulo : Companhia das Letras, 2011.

DEVI RS, Sivaprakash RM, Namasivayam A. Rat Hippocampus and primary immune response. Indian J Physiol Pharmacol 2004.

DOIGE, Norman – O cérebro que se transforma/ Norman Doidge; tradução Ryta Vinagre. – Rio de Janeiro: 2011.

GUYTON AC; Hall JE – Tratado de fisiologia médica. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.

HANSON, Rick – O cérebro de Buda: Neurociência prática para a felicidade / Rick Hanson, Richard Mendius; [tradução de Bianca Albert]. 1 ed. São Paulo: Alaudi Editorial, 1012.

KANDEL, Eric R.- Em busca da memória: o nascimento de uma nova ciência da mente; tradução Rejane Rubino. – São Paulo: Companhia das letras, 2009.

KANDEL, Erick R., [et al] – Princípios de neurociência / Editores, Erick Kandel...[et al.]; tradução: Ana Lucia Severo RodriguÊs... [ET al.]; revisão técmica: Carla Dalmaz, Jorge Alberto Quillfeldt. – 5. ed. – Porto Alegre: AMGH, 2014. 

LENT, Roberto – Cem bilhões de neurônios? : conceitos fundamentais de neurociência ? Roberto Lent. – 2. ed. – São Paulo: Editora Atheneu, 2010.

MACHADO, A – Neuroanatomia funcional. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 2004.

MASCARO, LEONARDO – A arquitetura do eu: psicoterapia, meditação e treinos para o cérebro /Leonardo Mascaro, - Rio Janeiro : Elseiver, 2008

MENESES, MS – Neuroantomia aplicada. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.

MENESES, Murilo – Neuroanatomia aplicada / [elaborada sob a direção de] Murilo S. Meneses. – 3.ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.

NIETZSCHE, Friedrich – Vontade de Potência / trad. Antônio Carlos Braga e Ciro Mioranza:  São Paulo: Escala, 2010.

PINKER, Steven – Como a mente funciona / Steve Pinker; tradução Laura Teixeira Motta – São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

RUSSEL, Bertrand – Por que os homens vão à guerra / Betrand Russel; tradução Renato Prelorentzou. – I Ed. – São Paulo: Editora Unesp, 2014.

VON, Cristina – Cultura de paz / Cristina Von. – São Paulo: Peirópolis, 2003.

 

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