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Estudo de Nogueira et al (2020) avalia a indicação de prática de exercícios físicos durante e após a pandemia

. | postado em 17/06/2020

Autores

Carlos José Nogueira; Antônio Carlos Leal Cortez; Silvânia Matheus de Oliveira Leal; Estélio Henrique Martin Dantas 

* O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001

RESUMO

A presente revisão visa analisar e sintetizar as evidências científicas sobre os efeitos do exercício físico na precaução do COVID-19 e as principais recomendações sobre a prática de atividade física durante e após a pandemia. Realizou-se uma busca junto às bases MEDLINE/PUBMED, Cochrane, Web of Science e Scopus, e buscas manuais em periódicos, nas referências dos estudos selecionados, além da utilização de estudos pré-print. A busca inicial totalizou 1026 registros. Após a exclusão por título, resumo, duplicatas e leitura na íntegra restaram 13 publicações, além de mais 10 estudos selecionados manualmente, totalizando 23 publicações. Após análise dos resultados, as evidências foram categorizadas de acordo com: os efeitos do exercício físico sobre infecções respiratórias virais, o impacto do COVID-19 em relação à inatividade física, saúde física e mental, as precauções e recomendações sobre a atividade física regular durante a pandemia do COVID-19 e recomendações sobre atividade física pós pandemia. A maioria das evidências recomendam a realização de atividade física moderada regular durante e após a pandemia. No entanto, recomendações mais específicas sobre a intensidade, o tipo de exercício, séries e duração do treino precisam de maiores investigações.

Palavras Chave: Exercício Físico, Coronavírus, Infecções por Coronavirus, Terapia por Exercício (DeCS)

INTRODUÇÃO

O coronavírus (COVID-19) emergiu no final de dezembro de 2019, na cidade de Wuhan na China, como a principal causa de pneumonia viral (1–3) e se espalhou rapidamente pelo país e por todos os continentes do mundo (2,4–6). Em março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o vírus SARS-Cov-2 uma pandemia global (3,7).

A atual pandemia de COVID-19 apresenta um inesperado desafio à saúde pública. Em todo o mundo, medidas ambiciosas estão sendo implementadas por governos, organizações não-governamentais e indivíduos com objetivo retardar a disseminação do vírus para evitar sobrecarregar o sistema de saúde (8). No entanto, ainda há muito a ser feito para "achatar a curva" e mitigar o impacto do coronavírus (9).

A transmissão do SARS-Cov-2 ocorre principalmente partir da disseminação respiratória de pessoa para pessoa (pessoas em contato próximo ou através de gotículas respiratórias produzidas quando uma pessoa infectada tosse ou espirra) e, em menor nível, do contato com pessoas contaminadas, superfícies ou objetos (1,10).

Condições clínicas como hipertensão, doenças respiratórias, cardiovasculares e metabólicas parecem ser importantes fatores de risco para a gravidade do COVID-19 (11,12). Os estudos atuais apontam como grupos de risco potencial: idosos (11,13,14), adultos jovens, obesos, indivíduos com as comorbidades descritas anteriormente, doenças crônicas com repercussão na parte hemodinâmica e imunológica (6,15).

O COVID-19, segundo Carda et al. (16), possui diferentes manifestações clínicas, sendo as mais observadas: 1) leve: sem dispnéia, sem baixa saturação de oxigênio no sangue (SatO2), com presença ou não de picos febril, perda de olfato e paladar; 2) moderado: dispnéia a pequenos e médios esforços SatO2 94% a 98% e sinais radiológicos de pneumonia; 3) grave: dispnéia, SatO2 ≤ 93%, com frequência respiratória (FR)> 30 / min, progressão radiológica das lesões, necessidade de suplementação de O2, eventualmente com ventilação não invasiva; e 4) crítico: os pacientes necessitam de ventilação mecânica.

A prática de exercícios físicos atua como medida benéfica para a melhora da imunidade na prevenção e tratamento complementar para doenças crônicas e infecções virais tais como o novo coronavírus (1,6,11,17–22). O efeito protetor do exercício físico no sistema imunológico é crucial para responder adequadamente à ameaça do COVID-19 (15,21,23).

A realização de exercícios físicos. regulares de intensidade moderada a vigorosa, segundo as diretrizes do Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM), irão: melhorar as respostas imunológicas à infecções; diminuir a inflamação crônica de baixo grau e melhorar os marcadores imunológicos e inflamatórios em vários estados de doenças, incluindo câncer, HIV, doenças cardiovasculares, diabetes, comprometimento cognitivo e obesidade (21,23).

Para combater o sedentarismo e melhorar a saúde física e mental o ACSM (24) divulgou recentemente um guia em que sugere que a atividade física (AF) de intensidade moderada deva ser mantida no período de quarentena em função do COVID-19, enfatizando a importância para a saúde de cada minuto fisicamente ativo. As diretrizes, diante da situação atual, sugerem 150 a 300 minutos por semana de atividade física aeróbica de intensidade moderada e duas sessões por semana de treinamento de força muscular (11,24).

Essa recomendação se estende a pessoas em distanciamento social que não estejam infectadas pelo COVID-19 e para pessoas que estejam infectadas, mas permanecem assintomáticas. Se os sintomas perdurarem, os exercícios físicos deverão ser interrompidos e o indivíduo deverá procurar aconselhamento médico (25).

Embora conter o vírus o mais rápido possível seja a prioridade urgente da saúde pública, existem poucas diretrizes para o público sobre o que as pessoas podem ou devem fazer em termos de manutenção de suas rotinas diárias de exercícios ou atividades físicas (26).

Dadas as preocupações com a crescente disseminação do COVID-19, é imperativo que as precauções de controle e segurança de infecções, assim como as recomendações adequadas para a prática de exercícios físicos de sejam seguidas (26).

Em vista da pandemia mundial do COVID-19 e da inevitável necessidade da população em se manter ativa principalmente através da realização de exercícios físicos, o presente estudo tem por objetivo analisar e sintetizar as evidências científicas sobre os efeitos do exercício físico na precaução do COVID-19 e as principais recomendações sobre a prática de atividade física durante e após o período da pandemia. Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que buscou determinar o conhecimento atual sobre a temática em estudo, de modo a identificar, analisar e sintetizar resultados.

 

MÉTODOS

As etapas da presente revisão foram conduzidas a partir de uma metodologia que proporciona a síntese de conhecimento e a incorporação da aplicabilidade de resultados de publicações significativas na prática (27).

A revisão cumpriu criteriosamente as seguintes etapas: formulação da questão norteadora; seleção dos estudos tendo como base o ano de publicação e título; seleção dos estudos por seus resumos e seleção pelo texto na íntegra; e posteriormente, extração dos dados dos estudos incluídos; avaliação e interpretação dos resultados e, por fim, apresentação da revisão do conhecimento produzido (28).

 

Processo de seleção dos Estudos

O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) via National Library of Medicine (PUBMED), Cochrane Central Register of Controlled Trials, Web of Science e Scopus. Também foram realizadas: busca manual em periódicos, nas referências descritas nos estudos selecionados e a utilização de material não-publicado (pré-print).

A busca inicial identificou 321 publicações. Após a remoção de duplicatas foi realizada uma triagem manual e excluídas aquelas que não eram relevantes. As publicações selecionadas foram avaliadas em texto completo quanto à elegibilidade. Aquelas que não atendiam aos critérios de inclusão foram excluídas. Foram incluídas 10 publicações através da busca manual em periódicos, nas referências descritas nos estudos selecionados e pré-print. O processo de seleção das publicações está descrito no fluxograma (Figura 1).

 

Estratégia de Busca

A busca foi realizada por pesquisadores treinados e com experiência no assunto dos artigos. As buscas foram atualizadas até 30 de abril de 2020. Foram utilizados os descritores selecionados nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e do Medical Subjetc Headings (MeSH): exercício (exercise), coronavírus (coronavirus), covid-19 (covid-19), infecção por coronavírus (coronavirus infections), conforme descrito e apresentado juntamente com a estratégia de busca no Quadro 1. A partir dessa busca, foram selecionadas publicações para leitura completa que atendiam aos critérios de inclusão para esta revisão. Quanto a análise científica das publicações, de acordo com o Qualis CAPES e o SJR, observou-se que 52,2% foram classificadas como A pelo Qualis CAPES e 34% , 08 periódicos obtiveram classificação e foram qualificados como Q1, totalizando 34,8% dos periódicos.

 

Quadro 1 – Descritores controlados utilizados para construção da estratégia de busca nas bases MEDLINE / PUBMED, Cochrane, Web of Science e Scopus.

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Critérios de elegibilidade

Foram incluídas publicações na íntegra em inglês, espanhol ou português sobre os aspectos relacionados aos efeitos do exercício físico na precaução e recomendações sobre a prática da AF durante e após a pandemia do COVID-19. As evidências compreenderam artigos originais e consenso, revisões, editoriais, entrevistas, além de estudos em fase de pré-publicação (pré-print).

 

Extração dos dados

O resumo incluiu a extração dos seguintes dados: autores e ano de publicação, tipo de estudo, objetivo e evidências. Finalmente, os resultados pertinentes ao conhecimento atual sobre a temática em estudo foram avaliados para a produção de evidências.

Resultados

A busca totalizou 1026 registros e após a aplicação dos filtros, 321 publicações foram selecionadas. Foram excluídos por título, resumo, duplicatas e após leitura na íntegra, 297 estudos. Ao final, 13 publicações compuseram a amostra e foram analisadas, além de mais 10 estudos em fase de pré-publicação (pré-print) selecionados manualmente. A figura 1 (Prisma Flow) descreve o percurso realizado para seleção dos estudos, segundo base consultada.

Conforme os descritores utilizados na pesquisa, identificou-se 118 publicações na MEDLINE/ PUBMED, 12 na Cochrane, 43 na Web of Science e 853 na Scopus. Abaixo segue a estratégia de busca após a aplicação dos filtros no Fluxograma (Prima Flow) 01.

f1

Foi realizada síntese narrativa das publicações selecionadas, apresentando as produções acerca das evidências científicas sobre o exercício físico e COVID-19. A extração dos dados foi realizada com auxílio de instrumento próprio, contendo informações sobre autores; ano de publicação; periódico, banco de dados, Qualis, SJR (SCImago Journal Rank), bem como a identificação das evidências científicas dos estudos selecionados. As produções incluídas foram organizadas em quadros de acordo com as variáveis identificadas.

 

Quadro 2. Síntese das produções incluídas na revisão integrativa, segundo autor/ ano de publicação, periódico, banco de dados, Qualis e SJR.

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De acordo com o Quadro 02, em relação aos periódicos que publicaram artigos sobre a temática, observa-se uma dispersão, uma vez que 02 periódicos (Progress in Cardiovascular Diseases e Journal of Sport and Health Science) publicaram 03 artigos cada, totalizando ao final 26,6% do total de artigos selecionados, com 47,83% e 43% desses periódicos indexados no PUBMED/MEDLINE e Scopus respectivamente, sendo que neste caso, vale ressaltar que alguns periódicos são indexados em mais de uma base dados.

Levando em consideração o QUALIS CAPES (sistema brasileiro de avaliação de periódicos) e o SJR (uma medida da influência científica de periódicos acadêmicos que responde pelo número de citações recebidas por um periódico e pela importância ou prestígio dos periódicos de onde essas citações vêm), observa-se que 52,2% foram classificados como A pelo QUALIS CAPES. Em relação ao SJR, 08 periódicos obtiveram classificação e foram qualificados como Q1, totalizando 34,8% dos periódicos.

Após análise dos resultados, surgiram quatro categorias temáticas, que foram caracterizadas abaixo e apresentadas de acordo com suas evidências científicas sobre exercício físico e COVID-19 no Quadro 3:

  1. Efeitos do exercício físico sobre infecções respiratórias virais;
  2. Impacto do COVID-19 em relação à inatividade física, saúde física e mental;
  3. Precauções e recomendações sobre a atividade física regular durante a pandemia do COVID-19;
  4. Recomendações sobre atividade física pós COVID-19.

 

Quadro 3 - sistematização das principais evidências encontradas sobre exercício físico e COVID-19.

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DISCUSSÃO

Efeitos do exercício físico sobre infecções respiratórias virais

A principal questão na área esportiva e da medicina do exercício é se a atividade física é adequada durante a epidemia do trato respiratório viral ou não (1).

Estudos indicaram que o exercício físico realizado com intensidade moderada tem efeitos positivos nas respostas do sistema imunológico contra infecções respiratórias virais (17,19,23,30,41–43) e está associado a vários benefícios anti-influenza, incluindo a redução do risco de influenza e o aumento nas taxas de eficácia da vacina (21,23,30,31).

Após atividade física de intensidade moderada, é detectado um aumento na contagem de células neutrófilas e natural killer (NK) e elevação das concentrações salivares de IgA (41,42). Desta forma, atividade física moderada aumenta os hormônios do estresse reduzindo a inflamação excessiva (42) e levando ao aumento da imunidade contra infecções virais através da alteração nas respostas das células Th1 / Th2 (41).

No intuito de verificar de forma mais aprofundada essa situação, Song et al. (14) sumarizaram a literatura atual sobre os efeitos do exercício sobre influenza ou pneumonia em idosos para determinar a forma apropriada de exercício que contribui para resultados clínicos benéficos para esta população. Os resultados confirmaram que exercícios aeróbicos com intensidade moderada podem auxiliar na redução do risco de infecção relacionada à influenza, melhorar as respostas imunes à influenza e vacinação contra pneumonia em idosos. Inclusivamente, as artes marciais asiáticas tradicionais também podem contribuir para alguns benefícios relacionados.

 

Impacto do COVID-19 em relação à inatividade física, saúde física e mental

A pandemia do COVID-19 parece ter grande impacto nos comportamentos de atividade física em todo o mundo obrigando as pessoas a permanecerem auto isoladas em suas casas por um período de tempo. Essas ações afetarão negativamente os comportamentos de atividade física das pessoas (25,32,33).

Atualmente, o mundo vive com duas pandemias concomitantes. Embora de natureza diferente, a pandemia da inatividade física / sedentarismo está presente na sociedade há alguns anos e torna-se mais ainda preocupante, tendo em vista que o COVID-19 está fazendo com que as pessoas se movimentem menos do que antes, estabelecendo o risco de uma piora da situação com a retomada da normalidade. A interseção entre os riscos atuais de complicações de saúde e as taxas de mortalidade associadas ao COVID-19 e o estado atual de inatividade física e sedentarismo não pode ser ignorada. Assim sendo, a sociedade global precisa estabelecer esforços severos para que as pessoas pratiquem atividade física após o COVID-19, no mínimo absoluto, manter a linha de movimento que praticavam antes da pandemia. Dessa forma, evitarão um possível ciclo viscoso em que padrões atuais e elevados de inatividade física e comportamentos sedentários piorem o impacto de futuras pandemias (34).

O impacto de um estilo de vida sedentário pode ser menor para crianças e adultos jovens, mas muito mais decisivo para as populações de risco nas quais incluem as pessoas com idade avançada (± 60 anos), com obesidade, diabetes, hipertensão, doença cardiovascular, histórico de tabagismo e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) (6).

Por apresentarem um maior risco de infecção pelo COVID-19, os idosos precisam permanecer em casa, o que torna crucial a prática de atividades físicas durante o período de quarentena como forma de evitar o sedentarismo (35). Como vai estar o nível de independência e saúde mental dos idosos após o final da quarentena se não houver uma campanha apropriada para promover atividade física em casa para eles?

Para tanto, Goethals et al.(35) realizaram um estudo qualitativo com o objetivo de avaliar o impacto da quarentena nas organizações do programa de AF da Federação Francesa de Educação Física e Ginástica Voluntária e na saúde física e mental de adultos mais velhos. Também verificaram quais alternativas poderiam ser sugeridas a essa população para evitar um estilo de vida sedentário. A pesquisa foi realizada através de entrevistas semiestruturadas com gerentes responsáveis pelos programas de atividade física para idosos e treinadores de esportes que administram esses programas. Os resultados do estudo sugeriram que a epidemia de COVID-19 afetou, mesmo antes das medidas decretadas para a quarentena, o número de programas de atividade física nos grupos de idosos. De acordo com os resultados, os idosos expressaram a necessidade de praticar exercícios em casa durante a quarentena, apesar do declínio da participação em atividades físicas antes das medidas de isolamento devido ao medo do contato com pessoas infectadas. Portanto, os autores recomendam a necessidade em auxiliar os idosos a integrar maneiras simples e seguras de permanecerem fisicamente ativos durante a pandemia de COVID-19 e uma política nacional de apoio a essa população para se exercitarem em casa (35).

Ainda para essa população, Jiménez-Pavón et al. (13) propõe uma prescrição e recomendação mais precisas para garantir um programa de exercícios físicos apropriado, destinado a manter ou melhorar os principais componentes da aptidão física relacionados à saúde durante a pandemia de COVID-19, através da participação regular em exercícios aeróbicos de intensidade moderada, além de atividades de fortalecimento muscular, equilíbrio, coordenação e alongamentos.

Outro grupo de risco vulnerável à infecção respiratória e efeitos adversos do COVID- 19 são as pessoas obesas, com sobrepeso, resistentes a insulina e com diabetes. Pois, geralmente apresentam inflamação crônica de baixo grau caracterizada por níveis elevados de várias citocinas pró-inflamatórias. Considerando que a progressão do COVID-19 depende em grande parte do estado inicial de saúde de um indivíduo e da resposta imune desencadeada pela infecção, sugere-se que o treinamento físico prévio e níveis elevados de aptidão cardiorrespiratória obtidos através treinamento aeróbico de intensidade moderada, provavelmente sejam imunoprotetores em pacientes infectados pelo SARS-CoV-2, principalmente para as pessoas que apresentam essas comorbidades crônicas (6).

 

Precauções e recomendações sobre a atividade física regular durante a pandemia do COVID-19

Em decorrência do aumento global da pandemia, torna-se indispensável que as preocupações de controle e segurança de infeções sejam seguidas. Assim, a permanência em casa é uma etapa fundamental de segurança que pode limitar a disseminação de infecções (26).

No entanto, ficar muito tempo em casa pode intensificar comportamentos que levam ao sedentarismo e contribuem para ansiedade e depressão o que pode resultar em uma série de condições crônicas de saúde (26,33). Desta forma é importante que a população seja esclarecida sobre a necessidade da redução do comportamento sedentário durante o período de isolamento social (36).

Portanto, manter atividade física regular e exercitar-se rotineiramente em um ambiente doméstico seguro é uma estratégia importante para uma vida saudável durante a pandemia do coronavírus (26). Os mesmos autores, seguindo as diretrizes do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA, recomendam pelo menos 30 minutos de atividade física moderada todos os dias e / ou pelo menos 20 min de atividade física vigorosa a cada dois dias, além da prática de exercícios de fortalecimento regularmente (26).

É sugerido que crianças, idosos e pessoas que já experimentaram sintomas do coronavírus ou são suscetíveis a doença cardiovascular ou pulmonar crônica procurem orientação com profissionais de saúde especializados sobre a segurança da prática de atividade física (26,31).

Cheval et al. (37) verificaram que mudanças na atividade física e comportamentos sedentários durante o confinamento estão associados a mudanças na saúde física e mental. Para tal, avaliaram diferenças na atividade física e comportamentos sedentários antes e durante o bloqueio em um total de 267 (1ª onda do COVID-19) e 110 participantes (2ª onda do COVID-

19) que moram na França ou na Suíça. Com base nos resultados encontrados, os autores reforçam que garantir níveis suficientes de atividade física e reduzir o tempo sedentário durante o bloqueio pode beneficiar a saúde dos indivíduos.

É importante destacar os motivos pelos quais a prática regular de exercícios físicos não deve ser interrompida durante a pandemia do COVID-19. Para tal, Raiol et al. (25) pesquisaram sobre os efeitos benéficos proporcionados pelos exercícios para as pessoas em distanciamento social, abordando aspectos relacionados a imunidade, controle de doenças, capacidade funcional e saúde mental. Após a análise da literatura, os autores sugeriram que, durante o distanciamento social os exercícios físicos devem ser realizados em casa ou em locais ao ar- livre sem aglomerações. A frequência deve ser de 5-7 dias por semana para os exercícios aeróbicos e, no mínimo, 2-3 dias por semana de exercícios de fortalecimento muscular, ambos com intensidade moderada, com intuito de maximizar os efeitos positivos no sistema imunológico.

Com base em evidências bem comprovadas, Laddu et al. (19) expandem os benefícios da prática regular da atividade física no aprimoramento da função imune e na redução do risco, duração ou gravidade das infecções virais. Para tanto, recomendam a prática habitual (~ 150 min por semana) de exercícios físicos de intensidade moderada para obter suporte imunológico ideal.

No entanto, evidências fortalecem que mesmo sessões agudas de AF podem proteger as pessoas contra infecções virais (44) apoiando a noção de que movimentar-se diariamente de forma estruturada pode otimizar as funções do sistema imunológico e prevenir ou atenuar a gravidade da infecção, especialmente entre populações vulneráveis com condições imunocomprometidas.

Portanto, conforme evidências disponíveis e na semelhança de alguns dos sinais e / ou sintomas do COVID-19 com o vírus H1N1, os exercícios moderados poderão ser recomendados durante o surto para indivíduos saudáveis ou assintomáticos. Pessoas com sintomas leves do trato respiratório superior (por exemplo, coriza, congestão nasal, dor de garganta leve) podem se exercitar levemente com precauções (30).

Vale ressaltar que, programas de exercícios prolongados ou treinamento de alta intensidade sem recuperação adequada podem causar imunodepressão e aumentar a suscetibilidade a patógenos e doenças infecciosas (19,23,30,31,41,42,45,46).

Oliveira Neto et al. (38) apresentaram uma proposta de prescrição de exercícios durante a pandemia do COVID-19, integrando os aspectos fisiológicos e psicobiológicos, considerando as barreiras enfrentadas pela população diante do isolamento social em todo o mundo. Assim, recomendam um modelo de prescrição que incentiva a realização de pelo menos 150 minutos de exercícios aeróbicos com intensidade moderada complementados com exercícios de força para os principais grupos musculares. Enfatizam também, a importância dos aspectos comportamentais, motivacionais paralelamente às variáveis fisiológicas como um dos grandes desafios, dada a necessidade de realizar treinamentos com pouca supervisão ou não presencial, o que pode aumentar as dificuldades comportamentais (por exemplo, hábito) para praticar exercícios físicos.

Com base em recomendações da OMS, Jakobsson et al. (33) reforçam os benefícios da atividade física durante a pandemia do COVID-19 no sentido de que “fazer algo é melhor do que não fazer nada”. E estabelecem as seguintes recomendações: evitar o tempo sentado prolongado; reduzir o sedentarismo com breves pausas ativas durante o dia; acumular pelo menos 150 minutos de AF de intensidade moderada ou 75 minutos de intensidade vigorosa por semana; utilizar aplicativos de treinamento para o monitoramento da AF e / ou acompanhar aulas de exercícios online para motivação do exercício; incluir exercícios cardiovasculares e de fortalecimento muscular; ser sempre cauteloso e ciente de suas próprias limitações e não fazer exercícios com sintomas de infecção.

Hammami et al. (32) apresentam informações uteis para a realização diária de AF em casa para pessoas sedentárias durante a pandemia estendendo as recomendações para as crianças e adolescentes. As crianças e jovens (5 a 17 anos) deverão realizar 60 min / semana de AF diária com exercícios aeróbicos de intensidade moderada a vigorosa além de fortalecimento muscular e ósseo três vezes por semana. Já os para adultos e idosos (> 17 anos), recomenda-se AF diária por 75 min / semana com exercícios aeróbicos de intensidade vigorosa ou 150 min / semana de intensidade aeróbica moderada, com fortalecimento muscular e ósseo duas vezes por semana. Recomendam ainda, que as pessoas permaneçam ativas exercitando-se em casa. Neste sentido, poderão ser aplicadas diferentes tipos de atividades, incluindo exercícios aeróbicos usando bicicletas estacionárias ou ergômetros de remo, treinamento de força com peso corporal, exercícios baseados em dança e jogos ativos.

Fallon et al. (18) incrementam as formas de exercícios para serem realizados em casa durante a pandemia do COVID-19. Uma pesquisa simples na Internet ou no YouTube revelará muitos programas domésticos de dança, aeróbica, ioga, Pilates, exercícios de força e alongamento. O exercício aeróbico pode ser facilitado pelo uso de escadas e inclinações; correndo no local; bicicletas de exercício em casa, esteiras e máquinas de corrida; ou voltas da

piscina do quintal. A atividade de fortalecimento poderá ser realizada através exercícios contra o peso corporal, como agachamentos, flexões, abdominais e elevações de panturrilhas na beira de uma escada ou inclinação, também são úteis. Poderão ser utilizados como sobrecarga utensílios domésticos simples, como garrafas de água cheias e latas ou pacotes de alimentos.

Na opinião de Simpson e Katisanis (23), provavelmente é dispensável a utilização da tecnologia e equipamentos especializados para manter-se fisicamente ativo durante o surto do coronavírus, visto que, exercitar-se em casa ou ao ar livre através de caminhadas rápidas, subidas de escadas, trabalho no quintal / casa e / ou jogar jogos ativos podem ser igualmente eficazes a utilização de plataformas de exercícios on line neste período.

Para melhor enfrentamento deste momento de isolamento social, Ferreira et al. (11) propõe à população alguns comportamentos e atitudes que ajudarão na manutenção da vida ativa e melhora da saúde física e mental: realizar atividades físicas prazerosas, explorando da melhor forma os espaços e materiais disponíveis; realizar atividades rotineiras como limpeza, manutenção e organização dos espaços domésticos; brincar e se exercitar com as crianças, adolescentes e animais de estimação (promovendo gasto energético superior à condição de repouso); evitar o comportamento sedentário, intercalando o tempo sentado ou deitado com períodos de atividade física, reduzindo o tempo de uso de dispositivos eletrônicos (36) e reservar alguns minutos para atividades de alongamento, relaxamento e meditação (11).

Em função do aumento da necessidade de realização de exercícios físicos durante a quarentena Jiménez-Pavón et al. (13) após análise crítica das recomendações mais apropriadas para o exercício, em especial para a população idosa, ajustaram e incrementaram as recomendações internacionais sobre AF para a situação atual. Os autores sugerem um aumento para 200 a 400 minutos por semana, distribuídos entre 5 a 7 dias para compensar a diminuição dos níveis diários normais de AF. Ademais, um mínimo de 2-3 dias por semana de exercício resistido pode ser recomendado, além de rotinas diárias de exercícios de alongamento e exercícios de equilíbrio e coordenação pelo menos duas vezes na semana, distribuídos entre os diferentes dias de treinamento. Com relação a duração de cada sessão de exercícios Pitanga et al. (36) recomendam que a aproximadamente 30 a 60 minutos por dia.

Vale salientar que o controle da intensidade dos exercícios é crucial para evitar efeitos nocivos e promover a melhora do sistema imunológico. Para tal, durante os tempos de quarentena, a intensidade moderada (40 a 60% de reserva da frequência cardíaca ou 65 a 75% da frequência cardíaca máxima) deve ser a melhor opção, principalmente para os idosos (13).

Rodrígues et al. (15) analisaram as recomendações para a realização da AF durante o período da pandemia de instituições de saúde, dentro e fora da Espanha. No geral, todas as entidades fornecem as mesmas recomendações gerais: manter-se ativo em casa, fazer pausas curtas e evitar o estilo de vida sedentário. Reforçam ainda que, para se manter ativa durante o confinamento a população deve realizar programas multifuncionais para todo o corpo, que incluem exercícios aeróbicos, de fortalecimento muscular, equilíbrio e alongamento, além de tarefas cognitivas que são fortemente recomendadas para idosos.

No entanto, nenhuma das instituições faz recomendações específicas sobre séries e repetições, intensidade ou frequência, e a maioria recomenda o uso de aulas on-line ou aplicativos móveis (15).

Com relação à realização de AF fora do ambiente doméstico, publicações fundamentadas em descobertas cientificamente sólidas e aderindo às regras atuais de distanciamento social recomendam a permissão de atividades moderadas de esportes ao ar livre (como corrida, caminhada e andar de bicicleta) e o uso de trilhas de parque, trilhas para caminhadas e estradas florestais em terrenos fáceis (8,47).

Os resultados de um recente estudo sobre os efeitos aerodinâmicos do movimento, realizados através de uma simulação computacional de dinâmica de fluidos, na ausência de vento principal, vento traseiro e vento cruzado, apontam para a necessidade de precauções adicionais de distanciamento social para as atividades e esportes praticados ao ar livre. Precisam ser mantidas distâncias de 05 metros ao caminhar rápido a 4km/h e 10 metros ao correr a 14,4 km/h. Além disso, as pessoas devem evitar andar ou correr diretamente atrás da pessoa principal e manter uma distância de 1,5 m em um arranjo alternado ou lado a lado (48).

A partir de algumas evidências indiretas, parece que a AF moderada pode ser recomendada como uma maneira não farmacológica, barata e viável de lidar com a infecção pelo COVID-19. No entanto, os exercícios de alta intensidade podem ser nocivos e exacerbar a infecção, principalmente em pacientes dos grupos de risco, provavelmente devido à produção de oxidantes e à supressão do sistema imunológico. Dessa forma, a recomendação destes exercícios precisa de maiores investigações (39,46).

Os resultados de uma recente revisão sistemática evidenciaram que exercícios longos e intensos podem levar a níveis mais altos de mediadores inflamatórios, o que pode acarretar um aumento no risco de lesões e inflamação crônica. No entanto, exercícios moderados ou vigorosos com períodos de descanso apropriados podem ser bastante benéficos para a melhora da função imunológica (46).

De acordo com Zhu (31) é seguro exercitar-se durante o surto de coronavírus. No entanto, pode haver algumas precauções adicionais para reduzir o risco de infecção. Para os “exercitadores sociais”, é conveniente limitar a exposição a parceiros de exercícios sintomáticos e em alguns casos, pode ser apropriado o uso de uma máscara durante o exercício para evitar a exposição.

 

Recomendações sobre atividade física pós COVID-19

Uma situação importante a ser discutida é sobre a manutenção ou retorno à atividade física durante ou após uma infecção do trato respiratório superior. Halabchi et al. (1) apoiam- se em evidências sobre a regra de verificação do pescoço”. Se os sintomas da infecção do trato respiratório superior forem limitados sobre o pescoço, incluindo tosse, espirros e dor de garganta, a pessoa é solicitada a correr por 10 minutos. Se a condição geral e os sinais estiverem deteriorados, deve ser proibida a realização de atividades físicas até a recuperação total. Caso as condições não alterem após os 10 minutos de corrida, a pessoa poderá retornar à atividade física de baixa a moderada intensidade (abaixo de 80% do VO2 máx).

Entretanto, devido às novas características do COVID-19 e seu efeito negativo no sistema imunológico e complicações cardíacas raras, incluindo miocardite, exige-se mais cautela quanto à continuação do exercício em pacientes sintomáticos (1).

Portanto, as pessoas que já foram infectadas por gripe, síndrome respiratória aguda grave (SARS) ou o atual COVID-19 podem se exercitar moderadamente desde que apresentem sintomas leves do trato respiratório superior (por exemplo, coriza, congestão nasal, dor de garganta leve). Todavia, não é recomendável o exercício físico para pessoas com sintomas de dor de garganta intensa, dores no corpo, falta de ar, fadiga geral, tosse no peito ou febre (30). Recomenda-se procurar atendimento médico se apresentar esses sintomas (31).

Em geral, a recuperação de infecções virais respiratórias leva de 2 a 3 semanas, o que corresponde ao tempo para o sistema imunológico gerar células T citotóxicas necessárias para limpar o vírus das células infectadas. Após esse período, quando os sintomas desaparecerem, é seguro começar a se exercitar regularmente de forma progressiva (31).

No que diz respeito ao retorno de crianças e adolescentes em idade escolar à AF após o COVID-19, Chen et al. (40) apontam que com a retomada às atividades escolares há uma necessidade de saúde pública para garantir que todas as crianças e jovens ultrapassem efetivamente as restrições impostas que limitavam o exercício, participando dos níveis recomendados de AF durante o dia escolar, incluindo o tempo que passam sendo ativos nas aulas de educação física. Esse retorno à prática de AF pode ajudar os alunos a se recuperarem do estresse e da ansiedade que experimentaram enquanto estavam em quarentena.

Assim, restauração das atividades físicas e esportivas diárias deve ser progressiva, começando com curtos períodos de atividades mais atraentes para crianças e jovens e aumentando gradualmente o número de dias e a quantidade de tempo de participação, para que eventualmente seja suficiente para atender às diretrizes, minimizando o risco de lesão após o confinamento (40).

 

LIMITAÇÕES

Aponta-se como limitações desta pesquisa a ausência de ensaios clínicos randomizados e a escassez de estudos com delineamento experimental, com pouco rigor metodológico sobre a temática atual, impossibilitando a apuração da validade de métodos e dos resultados. Outra limitação refere-se as publicações sobre diferentes populações devido a emergência do tema em estudo. Assim elenca-se uma necessidade de estudos com maior nível de evidência científica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Visto o exposto, de acordo com os resultados dos estudos selecionados, optamos em apresentar nossas considerações finais em tópicos para melhor entendimento dos achados dessa revisão, dentro das quatro categorias temáticas identificadas.

Em relação aos efeitos do exercício físico sobre infecções respiratórias virais as evidências apontam para os efeitos positivos da realização do exercício físico de forma apropriada com intensidade moderada nas respostas do sistema imunológico, o que poderá contribuir para a redução da inflamação e do risco de infecção nas pessoas.

Sobre o impacto do COVID-19 em relação à inatividade física, saúde física e mental, os resultados apresentam um impacto negativo da inatividade física e sedentarismo durante e após a pandemia, com efeito maior nas populações de risco, principalmente os idosos. Assim, é fundamental o empenho da sociedade mundial com reforços na divulgação, orientação e conscientização sobre a redução do comportamento sedentário durante o período de isolamento social e a necessidade e importância da realização de exercícios físicos em casa. Visto que, mudanças nos comportamentos sedentários das pessoas durante a pandemia estão associados às mudanças na saúde física e mental, preparando a população para futuras pandemias.

Quanto as precauções e recomendações sobre a AF regular durante a pandemia do COVID-19 é evidente que movimentar-se diariamente de forma estruturada, através da realização de exercícios físicos, pode otimizar as funções do sistema imunológico e prevenir ou atenuar a gravidade da infecção, especialmente para as populações mais vulneráveis. Neste sentido, as recomendações são majoritárias quanto à prática de AF com intensidade moderada durante o período de isolamento social. Sugere-se a realização de exercícios aeróbicos de 5-7 dias por semana, com exercícios de fortalecimento muscular no mínimo 2-3 dias por semana, além de exercícios de coordenação, equilíbrio e mobilidade, sendo contraindicados programas de exercícios prolongados ou treinamento de alta intensidade sem recuperação adequada para evitar a imunodepressão e maior suscetibilidade às infeções. As atividades físicas ao ar livre são recomendadas desde que sejam tomadas as devidas precauções adicionais de distanciamento social.

A partir da análise das evidências do presente estudo nota-se uma carência de publicações que enfatizam a quantificação da intensidade para a realização dos exercícios físicos durante a pandemia, assim como recomendações específicas sobre séries e repetições dos exercícios.

Exige-se cautela quanto ao retorno, manutenção e continuidade da AF pós COVID-19, principalmente devido ao efeito negativo no sistema imunológico e complicações cardíacas causadas pelo vírus.

É importante salientar que esta revisão foi realizada com base em estudos publicados (ou em fase de pré-publicação) até o presente momento, e que uma grande quantidade de novos estudos continua sendo produzida todos os dias. Dessa forma, apesar da variedade das publicações selecionadas, a maioria das evidências científicas analisadas ainda são preliminares e de baixa qualidade metodológica e as recomendações apresentadas estão sujeitas a mudanças conforme surjam novas evidências.

FONTEhttps://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/download/504/637/656

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